E aquela mágica da outra vez? Não vai fazer?

Sempre que alguém me perguntava isso ao final de um show de ilusionismo intimista, se referia a algum truque marcante que eu fizera e que deixara uma impressão forte. Um truque tão impressionante que o espectador ficava ansioso para vê-lo de novo. Alguns dos efeitos favoritos de alguns dos meus clientes, que, após se surpreenderem com a magia, me chamavam para repetir a dose nas próximas ocasiões.

Lembro de um cliente que me contratou pela quarta vez para a mesma família. Ele sempre valorizava o meu trabalho e, a cada evento especial, lá estava eu, seja para o aniversário de 25 ou 28 anos das filhas, ou para comemorar os 30 anos de casamento com sua esposa em uma festa de bodas de pérola. Eu mesmo criei efeitos exclusivos para personalizar o show, como aquelas mágicas com pérolas que surpreenderam a todos.

Porém, o evento mais recente era a festa de desligamento dele da empresa, um misto de familiares e colegas corporativos. Para essa ocasião, decidi levar algo inédito. Afinal, os 15 membros da família já haviam me visto outras três vezes. Embora sempre tentasse variar alguns atos, a estrutura do show permanecia parecida, o que, artisticamente, poderia acabar saturando.

Então, preparei uma rotina completamente nova, com efeitos inéditos e até alguns importados de alto custo. Eu estava animado e queria oferecer o melhor para o meu cliente.

Na véspera do show, comentei com ele que essa seria uma apresentação especial. Eu estava trazendo novos efeitos, e tanto os familiares quanto os novos convidados iriam se surpreender. O clima na família estava radiante, todos eufóricos para a nova experiência de ilusionismo.

O show começou às 22h e foi uma sequência intensa de efeitos impactantes. Alguns desses efeitos, admito, não se encaixaram perfeitamente com meu estilo, mas é normal que ao testar novas mágicas isso aconteça. O importante é que, no final, tudo foi bem recebido e a plateia reagiu com entusiasmo. Eu também estava satisfeito com os resultados, apesar da tensão de testar novos atos com uma audiência que já me conhecia bem.

Quando o show terminou, os aplausos foram calorosos, e o público, como sempre, se mostrou receptivo. A produtora logo fez novos contatos para futuros eventos, o que me deixou ainda mais feliz. No entanto, ao me retirar, algo me chamou atenção no olhar do contratante. Ele parecia… insatisfeito?

Fui até ele e perguntei se estava tudo bem. Ele me disse:

“Sim, seu show foi impecável, mas só faltou uma coisa…”

Confesso que, naquele momento, pensei que ele estivesse falando sobre algum efeito que eu havia deixado de fazer. Afinal, havia modificado muitos dos números para trazer algo novo. Mas, para minha surpresa, ele mencionou o truque das bolinhas.

“Eu gostaria muito que você tivesse feito aquela das bolinhas”, ele disse, com um sorriso triste.

E agora aqui nesse blog, explico o que são as mágicas das bolinhas:

É um efeito clássico que muitos mágicos de “close-up magic” fazem que são com bolas de espuma. Porém o efeito básico utiliza de duas esferas, no máximo quatro. Só que a minha versão finaliza com uma aparição de 20 esferas na mão do espectador e sempre é uma explosão de surpresa. Praticamente um dos meus best-sellers.

Continuando ao olhar e frases cabisbaixas do Sr. Teixeira…

“Não tem problema, já sabemos que você vai continuar nos surpreendendo nos próximos eventos. Na próxima vez, você faz as bolinhas, certo?”

Eu imediatamente percebi que não poderia deixá-lo frustrado. Então, disse sem pensar duas vezes:

“Não! Eu não vou embora sem fazer o seu truque favorito.”

Foi aí que a mágica aconteceu. Levei-o de volta ao centro do salão, preparei a mesa, avisei ao DJ e pedi uma pausa no som por cinco minutos. Mesmo sem entender muito bem, o DJ acatou. Com o público acomodado novamente, expliquei a situação:

“Esse é o meu querido cliente, o Sr. Teixeira, e ele adora um truque específico que, por alguma razão, não fizemos no show. Mas, agora, vou realizar esse efeito especialmente para ele.”

O público, curioso, aplaudiu calorosamente, e o Sr. Teixeira, com um sorriso de criança, ficou visivelmente feliz. Realizei o truque das bolinhas, e foi um sucesso absoluto, como sempre.

Após o ato, me despedi da plateia, agradeci ao DJ, e o evento seguiu com a música eletrônica discreta. O Sr. Teixeira, já visivelmente mais contente, me falou:

“Você é o meu favorito. Eu te amo!”

Depois disso, ele me contratou mais duas vezes, totalizando seis apresentações. Fiquei muito grato, e, enquanto dirigia para casa, refleti: por que um efeito tão simples, entre tantos outros mais complexos, poderia ter tanto significado para ele?

A reflexão me trouxe uma lição: até onde devemos mudar aquilo que já está dando certo? O ditado “time que está ganhando não se mexe” nunca fez tanto sentido. Se algo funciona, devemos preservar. E, após mais de duas décadas de carreira, é isso que continuo fazendo.

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